Energias renováveis trazem possibilidades para a Pan-Amazônia

Alto Urupadi, no Amazonas, teve a produção de guaraná orgânico e óleo de copaíba impulsionada pela energia solar.

Sem acesso à energia elétrica, a população do Alto Urupadi, no Amazonas, viu a sua realidade mudar com a instalação de painéis solares, que impulsionaram o cultivo do guaraná orgânico e do óleo de copaíba. O exemplo da comunidade, que hoje vê seus produtos exportados e patenteados, foi um dos temas em debate na manhã desta sexta-feira (21), no V Congresso Internacional de Direito Ambiental e Desenvolvimento Sustentável promovido pela Escola Superior Dom Helder Câmara.

“Essa tecnologia passa a ser importante porque liberta as populações, até então invisíveis, que vivem da coleta da floresta. Eles não derrubam a mata, e agora, com a energia solar, têm condição de produzir com uma rentabilidade muito maior e também de armazenar as frutas no período da entressafra”, apontou o professor Valmir César Pozzetti, da Universidade Federal do Amazonas (UFAM).

Doutor em Biodireito pela Université de Limoges (França), Valmir integrou o time de palestrantes do Painel III, que contou também com a participação dos professores Gustavo Arturo Zambrano Chávez, da Pontificia Universidad Católica del Perú (PUCP), e Luiz Felipe Barboza Lacerda, secretário Executivo do Observatório Nacional de Justiça Socioambiental Luciano Mendes de Almeida (OLMA). Os professores Magno Federici Gomes e Maraluce Maria Custódio, da Dom Helder, atuaram como mediadores.

Benefícios  

De acordo com o professor Valmir César, o principal ponto do projeto de energia solar em Alto Urupadi foi o treinamento da comunidade para a manutenção dos equipamentos, que tem alto custo e deve ser feita com grande frequência, devido às características peculiares do clima na região. “A Amazônia é uma região com muito calor, sol e umidade. Então eles receberam não só a tecnologia, mas o conhecimento. Se der algum problema, eles mesmos têm condição de consertar, isso trouxe independência e soberania para a população”, reforçou Valmir.

Outro ponto importante apontado pelo professor foi a adesão do Amazonas a convênio do Conselho Nacional de Política Fazendária (CONFAZ), que concede a isenção de tributos para a energia solar. “Isso vai beneficiar não só os povos ribeirinhos, mas as populações urbanas. Hoje temos programadas para serem inseridas dentro da floresta 23 usinas hidroelétricas, que vão causar um prejuízo muito grande à flora, à fauna e ao meio ambiente. Usando essa tecnologia, evitar-se-á a construção dessas usinas”, apontou.

Realidade peruana

A opção pelas energias renováveis também é apontada como prioridade pelo governo peruano, que prevê a troca de sua matriz energética até 2030. A situação, no entanto, é complexa, uma vez que o país deseja aumentar a produção de hidrocarbonetos para custear essa mudança. “É um pouco perverso. O argumento do Estado é que não há dinheiro suficiente”, afirmou Gustavo Arturo Zambrano.

De acordo com o professor, a corrida por hidrocarbonetos deve incluir a exploração em selva, uma vez que o petróleo encontrado na região amazônica é de melhor qualidade. “Apenas 14% das famílias peruanas possuem carros, é um mercado muito atrativo, que não temos a capacidade de satisfazer. O Peru vive hoje uma grande demanda por derivados de petróleo e gás”, informou.

Em contrapartida, o país é um dos mais afetados pelas mudanças climáticas, que tendem a se agravar com a exploração dos hidrocarbonetos. “Não creio que há uma real consciência da dimensão que isso significa. Se há tentativas de nos adaptarmos às mudanças climáticas, há também muitas dificuldades. Uma coisa é uma campanha para reciclagem de plástico, outra coisa é modificar normas que tem a ver com a emissão de carbono, por exemplo”, completou Gustavo Arturo, em entrevista ao Dom Total.

Integração

A última palestra da manhã foi preferida pelo professor Luiz Felipe Barboza Lacerda, Secretário Executivo do Observatório Nacional de Justiça Socioambiental Luciano Mendes de Almeida (OLMA). Criado pela Província dos Jesuítas do Brasil, o OLMA reúne mais de 70 instituições e desenvolve projetos em diferentes áreas, uma delas voltada especificamente para a Amazônia e os povos tradicionais. “Hoje a Amazônia tem duas dimensões muito problemáticas. A externa, com temas de apelo internacional, como o desmatamento, a grilagem e a extração de madeira ilegal. E há também problemas muito internos, que não aparecem na mídia tradicional, como a questão do saneamento básico e do emprego do jovem. São elementos que geram desigualdade social e, em consequência, levam a problemas ambientais”, afirmou.

Para desenvolver os seus projetos, o OLMA busca um ‘caminhar integrativo’, embasado na perspectiva da ecologia integral trazida pela encíclica Laudato si. “Ainda existe uma dificuldade em aliar o social e o ambiental. Como podemos mudar paradigma dissociativo, tanto na academia quanto em nossas práticas? A crise ambiental não é uma crise diferente da social, é a mesma crise”, ressaltou Luiz Felipe. O secretário também destacou a alegria em estar na Dom Helder, que apontou como referência para a Rede de Promoção da Justiça Socioambiental dos Jesuítas no Brasil.

De: Dom Total