Ouça o podcast aqui:
Grandes Projetos e Impactos Ambientais em Comunidades Quilombolas
O modelo de desenvolvimento econômico em curso no Brasil coloca os povos da amazônia, entre eles as comunidades quilombolas, no centro de intensos conflitos pelo avanço e implantação de grandes projetos na região que estão calcados na apropriação das riquezas naturais, expanção de fronteiras de abertura comercial e destruição de territórios. Estamos falando de um conjunto de empreendimentos de fortes impactos ambientais e que alteram os modos de vida de nossos povos como: hidrelétricas, estradas, ferrovias, hidrovias, campos de petróleo, gás e energia, entre outros.
Para assegurar as condições de desenvolvimento sustentável no país, na década de 1970 foi criada a Secretaria Especial do Meio Ambiente na qual com o tempo foram estabelecidos objetivos e ações que embasaram uma Política Nacional de Meio Ambiente amparada na Constiruição Federal de 1988. Esta política assegura as condições de desenvolvimento socioeconômico, porém sem perder de vista a proteção à dignididade da vida e o equilíbrio ecológico. Com isso, foram criados alguns mecanismos para o controle das atividades desenvolvimentistas. Os Estudos de Impacto Ambiental (EIAs) são um deles.
No entanto, os EIA’s tem se mostrado ineficientes muitas vezes, no que diz respeito às avaliações de grandes projetos na Amazônia, e com isso tais projetos são licenciados. O objetivo dos EIA’s é realizar a avaliação ampla e completa dos impactos ambientais de empreendimentos e indicar as medidas mitigadoras correspondentes. Mas, suas estimativas sobre os danos ao meio ambiente, ecossistema e população cada vez mais parecem desconsiderar o espaço habitado próximo a possíveis empreendimentos o que sugere falhas.
Já há estudos que apontam a necessidade de medidas corretivas e complementares as metodologias dos EIA’s. Hoje, alguns instrumentos usados são: imagens de satélite, espectroscopia no infravermelho próximo e código de barras de DNA para detectar um maior número de espécies, o que não é suficiente.
Além disso, hoje, a legislação ambiental brasileira representa uma ameaça as comunidades tradicionais, já que foi flexibilizada e desregulamentada para favorecer as grandes empresas sem levar em conta as populações que vivem no território amazônico. O que gera um grande número de conflitos ambientais entre as populações tradicionais que lutam pela preservação de seu meio, território, identidade e herança e as grandes empresas que avançam e invadem a terra que não pertence a eles.
No Brasil há vários ordenamentos juridicos que visam a proteção e garantia dos direitos dos povos tradicionais também, ainda que não enxerguemos a aplicação dos mesmos na maioria dos casos. O art. 2° da Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), adotada pelo Decreto Presidencial nº 5.051,de 19 de abril de 2004, determina que o Estado proteja essas populações que possuem um modo de vida e culturas diferenciados. Os arts. 4º,6º e 7º determinam que a participação dos povos tradicionais na elaboração de políticas públicas e medidas protetivas é essencial, e que essas medidas devem ser direcionadas conforme as demandas listadas e apontadas pelas próprias comunidades.
Apesar da proteção legal e constitucional, essa não é uma realidade dos povos tradicionais na Amazônia que vivem sobre pressão e ameaças todos os dias, e são sufocados por grandes empreendimentos que não respeitam seus protocolos de consulta prévia livre e informada e todos os ordenamentos juridicos existentes.
Como exemplo desses impactos ambientais gerados pelos grandes projetos, temos o Quilombo do Abacatal que está dentro da região metropolitana de Belém, situado no município de Ananindeua, Pará. Formado por 114 famílias, é considerado o pulmão da região, pela sua extensa área verde preservada por todos os moradores do território. Além disso, é símbolo de muitas lutas e conquistas por salvaguadar o espaço que pertence a eles por herança e direito, ainda que sofram inúmeros ataques e ameaças oriundas de empreendimentos próximos como: subestação de energia, ferrovia, rodovia, gasoduto e até um lixão que tenta invadir seu território.
A Comunidade do Quilombo do Abacatal é cercada por projetos que a ameaçam, mas ela segue firme para garantir que sua cultura, seus alimentos e seus herdeiros continuem os modos de vida e práticas sustentáveis próprias dos seus antepassados e dos que hoje as preservam e entendem a importância da floresta em pé.
E para dar voz a essa causa e luta, trazemos as falas de quatro mulheres que são o símbolo dessa frente matriarcal que é Quilombo do Abacatal: Francisdalva Cardoso, Vanuza Cardoso, Vivia Cardoso e Thamires Cardoso Teixeira, da 7º e 8º geração desse território.
Texto: Suelem Velasco e Ana Lúcia Farias