Brasília, 6 de maio de 2024
Para celebrar o Dia do Trabalhador, o encontro Diálogos de Justiça e Paz debateu, no dia 6 de maio, o tema “Somos nós, e não as máquinas, o verdadeiro valor do trabalho”, inspirado na mensagem que o Papa Francisco dirigiu a empresários franceses em Paris, em agosto de 2023.
O encontro contou com a participação de Gabriela Lenz de Lacerda e de Rosilene Corrêa.
Gabriela Lenz de Lacerda é Juíza do Trabalho, Mestre em Direitos Humanos, Interculturalidade e Desenvolvimento pela Universidade Pablo de Olavide e atualmente é Vice-Coordenadora do capítulo brasileiro do Comitê Pan-Americano de Juízes e Juízas para os Direitos Sociais e Doutrina Franciscana (COPAJU). Rosilene Corrêa foi Dirigente do SINPRO e candidata a senadora nas eleições de 2022. Atualmente é diretora da Confederação Nacional dos Trabalhadores da Educação e Vice-Presidente do PT-DF. O debate foi mediado por José Geraldo de Souza Jr, ex-reitor da UnB e integrante da Comissão de Justiça e Paz do DF.
O evento, gratuito e presencial, aconteceu no auditório do Centro Cultural de Brasília e foi transmitido pelos canais do Observatório de Justiça Socioambiental Luciano Mendes de Almeida (OLMA), da Comissão de Justiça e Paz do DF e da Comissão Brasileira de Justiça e Paz no YouTube.
O mediador iniciou os trabalhos trazendo a memória da vida das primeiras comunidades cristãs, onde o produto do trabalho era distribuído a cada um conforme a sua necessidade. Nascia ali a justiça distributiva, conforme relatado nos Atos dos Apóstolos e surpreendentemente também no Manifesto Comunista de 1848. Salientou a importância de ter esse tema pautado para o mês de maio. Anunciou, em seguida, a realização do Curso sobre o Ensino Social da Igreja a partir das encíclicas sociais, sob os auspícios da Arquidiocese de Brasília e por iniciativa da Comissão de Justiça e Paz do DF. O título do curso é: “Se queres a paz, trabalha pela justiça” e está previsto para o período de junho a novembro de 2024.
Convidou primeiramente a Juíza Gabriela Lenz de Lacerda. Por ser gaúcha, manifestou-lhe solidariedade e, por meio dela, a todos os seus conterrâneos atingidos pela calamidade que se abateu sobre o Rio Grande do Sul. Falando como juíza e feminista oriunda de família católica, a juíza contou que se encontra afastada da religião há muito tempo, o que, para sua surpresa, não impediu que ela fosse convidada para o encontro de juízes e juízas na Academia do Vaticano que o Papa Francisco convocou em 2019, para se pensar o papel do Judiciário nas Américas. A partir desse encontro, formou-se o Comitê Pan-Americano de Juízes e Juízas pelos direitos sociais e doutrina franciscana, que se chama COPAJU, hoje coordenado pela Juíza do Trabalho Ananda Tostes, de Brasília. Agradeceu à Comissão Brasileira de Justiça e Paz, à Comissão de Justiça e Paz do DF, ao OLMA e ao Centro Cultural de Brasília pela ajuda em abrir espaços dentro da Igreja para as discussões sobre o trabalho do comitê.
Trouxe pontos de reflexão, começando pelo papel histórico da Justiça do Trabalho como espaço dentro do Judiciário brasileiro na regulação da relação desigual entre capital e trabalho na nossa sociedade capitalista e na defesa dos direitos sociais garantidos pela Constituição Federal. Dentre os desafios hoje existentes, citou a extrema vulnerabilidade dos trabalhadores e trabalhadoras, sobretudo os informais, afetados pela reforma trabalhista de 2017, que flexibilizou os direitos trabalhistas prometidos pela Carta Magna.
Em seguida, Rosilene Corrêa apontou a necessidade de se definir o mundo do trabalho de que se está falando. Lembrou que, por trás das grandes máquinas, da Inteligência Artificial, Chat GPT, das Big Techs, estão homens brancos e muito ricos e que estamos vivendo uma colonização digital. A tecnologia digital nos promete mais rapidez e facilidade, mas, na realidade, ela nos obriga a fazer muito mais coisas e nos escraviza. Contou que, quando se discutiu, no Congresso Nacional, a regulamentação dos direitos dos trabalhadores por aplicativo, ela fez um vídeo criticando a reação negativa dos próprios beneficiados. Recebeu deles muitos ataques e até ameaças, mandando que ela não se metesse na vida deles, ou seja, eles não se veem como vítimas de exploração e estão convencidos de que é melhor abrir mão dos seus direitos.
A palavra foi franqueada aos presentes, que levantaram questões sobre: a imprevisibilidade do mundo do trabalho; a necessidade de reconquistar direitos de proteção dos trabalhadores, que se perderam ao longo dos últimos 70 anos; a contenção da fome capitalista pela substituição dos trabalhadores e trabalhadoras pelas máquinas; a coragem de sair do sofá e da janela e adotar uma postura transformadora; a alienação no mundo do trabalho, que cria a exclusão; a alienação de si próprio nas tarefas repetitivas do capitalismo; a definição do que é liberal para os profissionais liberais; a participação da mulher na sociedade e na Igreja; a importância da tecnologia digital e da inteligência artificial quando servem para excluir, mas que são omitidas quando servem para gerar mais participação e possibilidades; como dar esperança à juventude da geração Z para que ela possa contribuir para uma maior consciência de classe trabalhadora.
As debatedoras responderam aos questionamentos, mostrando a importância de que as vozes femininas, que foram caladas, reajam e ajudem a pensar de forma criativa um outro mundo possível. Ressaltaram, ainda, a necessidade da sindicalização de professores e professoras, sobretudo em Brasília.
O mediador encerrou o encontro, lembrando as encíclicas e exortações do Papa Francisco, que, em diálogo com os movimentos sociais, propõe o trabalho em torno de três eixos: terra, teto e trabalho.
Ana Paula Inglez Barbalho, presidente da Comissão de Justiça e Paz do DF, convidou para a pré-estreia do filme “A cabeça pensa onde os pés pisam. Frei Betto e a Educação Popular”, de Frei Betto, marcada para o dia 7 de maio, no Espaço Itaú de Cinema do Shopping Casa Parque, em Brasília.
Padre Miguel comunicou que recebeu carta do Provincial dos Jesuítas do Brasil, informando que a Unisinos e o Colégio Anchieta estão coordenando as doações e os trabalhos de socorro aos afetados pelas enchentes no Rio Grande do Sul, que atingiram também os estabelecimentos da Província.
O próximo Diálogos está marcado para o dia 3 de junho e debaterá sobre o tema “Meio Ambiente, Direitos da Natureza e Mudanças Climáticas”.