Por Cláudia Pereira – Articulação das Pastorais do Campo
Representantes das pastorais sociais e organizações que pautam os direitos dos povos da cidade, do campo, das florestas e das águas estiveram reunidos (03/04) no Centro Cultural Missionário em Brasília (DF), para analisar as ações de incidência política diante a composição da Câmara e do Congresso Nacional. Na atual conjuntura do legislativo, embora a pauta de debate seja o ambientalismo, projetos de leis que impactam os direitos dos povos podem ser retomados. A política interna do Congresso no último período foi alterada em razão da pandemia da covid-19 e limitou a possibilidade de debate presencial sobre as pautas e empoderou ainda mais o presidente da Câmara na tomada de decisões, permitindo o avanço de pautas que violam os direitos dos povos e ainda tramitam no senado.
Desde 2021, o coletivo, que é constituído por organizações e as pastorais sociais junto à Comissão para a Ação Sociotransformadora da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), tem acompanhado a atuação do legislativo federal em referência às pautas dos povos originários, comunidades tradicionais e setores excluídos da sociedade. São grupos sociais que possuem um quadro histórico de violações dos direitos humanos e sofrem com os impactos de projetos de leis que envolvem as questões ambientais, climáticas, sociais e as legislações que afetam diretamente os mais pobres. Com a proposta de dialogar com os projetos que garantem os direitos dos povos, a Comissão tem refletido sobre os processos para sensibilizar o legislativo sobre os temas que envolvem a defesa dos povos e do meio ambiente.
No período da manhã, com análise profunda do cenário atual, os representantes dialogaram sobre as ações do novo governo brasileiro e analisaram os cenários do legislativo, que foi bastante afetado com poucas representações para defender as pautas prioritárias dos povos na Câmara e no Congresso. Diante deste contexto, os mais pobres venceram as eleições de forma parcial e o Congresso continua pouco acessível para dialogar com as pautas populares. A reflexão do coletivo para construir os caminhos de incidência política observou que é necessário identificar as frentes parlamentares que pautam os projetos sensíveis para dialogar. O panorama atual é sensível e semelhante às realidades e tendências das políticas no mundo, em que a sociedade é frequentemente polarizada, por causa da consolidação de movimentos e partidos de extrema direita.
A frente ruralista, que forma maioria e é oposição ao governo, busca oportunidades para fazer alianças com propostas de grandes projetos contraditórios que afetam diretamente povos e comunidades tradicionais, a exemplo da proposta de crédito de carbono. Atualmente, existem 30 comissões permanentes na Câmara dos Deputados, o que dificulta o acompanhamento dos processos de incidência. Nesta configuração, os projetos serão redistribuídos nas comissões, que são formadas por temas para debater as propostas legislativas. Na atual legislatura do Congresso, os projetos não são arquivados de um mandado para outro e continuam tramitando, a exemplo do PL 2366, que dispõe o tema da regularização fundiária, e outros projetos de leis que afetam os povos. As pastorais do campo destacaram os projetos de leis que são primordiais para debater neste atual governo.
Embora o cenário não seja dos melhores para fazer incidência política, o coletivo encontra outros caminhos além das comissões permanentes da Câmara. Os ministérios e conselhos que formam os órgãos colegiados e possuem transversalidade de pautas também são alternativas para fazer incidências. Nos últimos dois anos, as articulações da sociedade civil contribuíram muito para debater e frear projetos de leis que violam os direitos humanos, sobretudo no campo. O coletivo de incidência acredita que a mobilização das organizações e pastorais fortalecem as ações que envolvem as pautas populares.
Isolete Wichinieski, da coordenação da Comissão Pastoral da Terra (CPT), destacou as ações de incidência dos últimos anos junto às organizações ambientais que articularam pautas com o coletivo de direitos. Outro destaque é o Tribunal Permanente dos Povos, que condenou o Estado brasileiro por genocídio e ecocídio do Cerrado. A sentença incluiu o governo de Jair Bolsonaro, instituições públicas, organizações e empresas nacionais e internacionais. O Conselho Missionário Indigenista (Cimi) destacou a pauta sobre o marco temporal, que influencia os três poderes, e a revogação do Parecer 001/2017 da Advocacia-Geral da União (AGU), que trata da demarcação de terras indígenas.
“No momento, a prioridade é retomar as pautas em torno do direito dos territórios de povos e comunidades tradicionais, entre elas a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 504, que inclui o Cerrado e Caatinga entre os biomas considerados patrimônio nacional. E como pauta prioritária está o PL de regularização fundiária”, afirmou Isolete.
O coletivo encerrou o encontro com encaminhamentos e levantamentos de pautas específicas a partir das análises, que tiveram a contribuição de Nilton Tubino, assessor da Secretária Geral da Presidência da República. Os temas também serão evidenciados nas agendas do mês de abril, incluindo o Acampamento Terra Livre (ATL) que será realizado entre os dias 24 e 28, e no lançamento do Caderno de Conflitos da CPT no dia 17 de abril em Brasília (DF). O coletivo reforça a importância de uma sinergia para atuar nas incidências políticas para além das pautas emergências e expandir os espaços de interlocuções, para construir uma agenda efetiva com as pautas que norteiam o projeto popular na defesa dos direitos dos povos.
Fotos: Cláudia Pereira – Articulação das Pastorais do Campo
fonte: Articulação Nacional dos Povos e Comunidades Tradicionais