Vivemos tempos de degradação civilizacional na sociedade humana em geral e no Brasil em particular. O mais correto, talvez, seja dizer: “Vivemos uma crise civilizacional planetária”. Assertivas sobre este fenômeno que marca os nossos tempos, com uma humanidade doente em um planeta igualmente doente, não são novidade. Também são muitos os estudos e as manifestações de toda ordem que se debruçam sobre a temática dos sintomas crescentes e explícitos do estado de gravidade dessa doença global. Muitos elementos se conjugam para a análise desse diagnóstico, que, segundo estudiosos, intelectuais e lideranças importantes, revela uma situação quase terminal.
Os principais sintomas são: A humanidade perdeu o seu “bom senso humano”, envolvida em
superficialidades e com os seus valores fundamentais abalados. Entre estes valores estão a própria vida
e a dignidade. É escancarada a síndrome da prepotência arrogante e autossuficiente de alguns pequenos grupos, mascarada de forma vil diante de todos/as. Existem sinais claros do descaso, que em muitas situações políticas, econômicas e sociais não é só equivocado, mas descaradamente irresponsável,
resultando em acúmulo ignóbil de concentração de riquezas e de exclusão e morte das pessoas mais
sofridas, que são pobres, descartadas do mundo e vulneráveis em sua dignidade. Em diversos lugares,
também, se tornaram assustadoras as manifestações de racismos, xenofobias e preconceitos
discriminatórios.
A humanidade sofre, sobretudo, de um descuido clamoroso para com o cuidado da vida, em todos os sentidos, no que se refere à “mãe terra” e à “casa comum”. É a degradação, beirando à depravação, que ameaça os esforços e as conquistas civilizacionais da humanidade, após muita construção coletiva, muita luta e muito sangue.
O que estamos vivendo hoje no Brasil, em particular, nos faz voltar, mais do que nunca, para a triste herança que pesa de uma sociedade patriarcal, machista, racista, elitista, paternalista, escravagista e excludente, que ainda não conseguiu fazer as pazes consigo mesma e muito menos conseguiu amadurecer para um verdadeiro espírito republicano e uma prática da democracia. 1
Fruto de um processo longo de reflexões e interlocuções, o Marco de Orientação da Promoção da
Justiça Socioambiental – Marco PJSA – foi elaborado a partir de contribuições colhidas em diversas
instâncias no período de constituição da Província do Brasil – BRA, da Companhia de Jesus. Desde lá,
trata-se de um Marco em permanente construção coletiva. Em inícios de 2020 foi consenso que sua
redação teria que ser atualizada, face às novidades conjunturais na sociedade e na Igreja e, sobretudo,
face aos avanços nas reflexões internas da Rede de Promoção da Justiça Socioambiental e da Companhia
de Jesus.
>O momento em que esta nova versão foi produzida teve um desafio particular, pois se realizou no auge da pandemia da COVID-19, assustando o mundo todo e atingindo particularmente a sociedade brasileira em um contexto de total fragilização, debilidade estatal e desmandos da Ordem Pública. Essa pandemia colocou em debate muitas das certezas que orientam os avanços tecnológicos relativos ao atual processo de desenvolvimento econômico e social.
Diferentemente do que argumenta o senso comum, a pandemia da COVID-19 não é democrática, não afeta indiscriminadamente os diferentes estratos populacionais. É evidente que as populações indígenas, quilombolas, afrodescendentes, as que vivem nas periferias dos centros urbanos, as migrantes e refugiadas, entre outras historicamente colocadas em situação de vulnerabilidade são especialmente afetadas de forma contundente e fatal.
A percepção geral deste contexto histórico e a leitura crítica do momento atual reforça o nosso compromisso com os segmentos e grupos pobres, descartados da sociedade e vulneráveis em sua dignidade e com a defesa da vida em todos os sentidos em nossa Casa Comum, fiéis à nossa Missão de Reconciliação e Promoção da Justiça Socioambiental. A presente versão de nosso Marco de Orientação da Promoção da Justiça Socioambiental quer estar atenta a este momento particular vivido, sobretudo, ao longo do primeiro semestre de 2020.
O momento que vivemos (Prefácio da nova edição) do Marco da Promoção da Justiça Socioambiental (PJSA), da Companhia de Jesus – Província do Brasil (acesse-o AQUI: MarcoPJSA-2020-PUBLICAÇAO-PROVISORIA-MAIO2020)
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