Rituais e música abrem a 4ª Semana de Estudos Amazônicos em BH

Cerimônia de abertura da Semana de Estudos Amazônicos (Semea) 2019 contou com debate sobre Meio Ambiente. Foto (Thiago Ventura/DomTotal)

Gilmar Pereira

Centro das atenções mundiais nos últimos tempos, a Amazônia ainda é uma grande desconhecida da população brasileira. Reunindo representantes da sociedade civil, do poder público, dos povos amazônicos, de instituições eclesiais e da comunidade acadêmica, a 4ª Semana de Estudos Amazônicos (Semea) é uma resposta a essa lacuna. O evento acontece entre os dias 29 de outubro e 1º de novembro em diversas instituições ligadas à Companhia de Jesus na região de Belo Horizonte, entre elas a Dom Helder Escola de Direito, que recebe grande parte das atividades.

A 4ª Semea é uma iniciativa do Observatório Nacional de Justiça Socioambiental Luciano Mendes de Almeida (Olma), ligado a Ordem dos Jesuítas, e conta com apoio da Rede Eclesial Pan-Amazônia (Repam-Brasil). Trata-se de um evento anual, nascido em 2016 em Recife, na Unicap, com segunda edição no Rio de Janeiro, na PUC-Rio, e terceira em São Leopoldo, na Unisinos. Desta vez, além da Dom Helder, a semana conta com parceria e atividades na Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia (Faje), no Centro Loyola de Fé e Cultura, no Colégio Loyola e Paróquia Santíssima Trindade (Santa Luzia – MG), todas instituições jesuítas.

Na mesa de abertura, estiveram presentes pela Dom Helder o reitor Paulo Stumpf; Kiwonghi Bizawu, pró-reitor, e Mariza Rios, representante da instituição junto ao Olma. Além deles também compuseram a mesa David Romero, da Preferência Apostólica Amazônica (Paam) dos Jesuítas; José Ivo Follmann, do Olma, e Geraldo de Mori, reitor da Faje.

A participação significativa de estudantes no evento foi destacada pelo reitor da Dom Helder, que enfatizou a importância do momento atual, pós-sínodo amazônico, encerrado no último domingo (27), no Vaticano. Na mesma linha, o professor Kiwonghi enfatizou a importância da Semea na urgência da consciência ambiental, o que foi endossado pelos outros membros da mesa. “Devemos despertar a consciência ecológica, a consciência de uma sociedade solidária no respeito ao meio ambiente e aos povos indígenas. Quem ama cuida, devemos ser protagonistas na preservação de um meio ambiente equilibrado”, disse.

A professora Marisa fez um apelo aos presentes: “Nós somos a Amazônia! Nós nos preparamos para esse momento da Semea, pois o Direito deve ter como o núcleo o cuidado com a Casa Comum. Devemos ter uma educação que pensa para além dos muros da faculdade. Na Casa Comum não existe o meu direito ou do outro, mas o direito de todos”.

Hino e mística

Mais do que falar sobre a Amazônia, o evento se propõe a ser um espaço de experiência. E como tal, ao fim da mesa que norteou a semana, a abertura se deu com o canto do Hino Nacional Brasileiro em língua tikuna, entoado pela cantora Djuena Tikuna.

Ao fim do hino, representantes dos povos amazônicos adentraram o auditório paramentados com vestes tradicionais e portando símbolos da cultura amazônica e estandartes de pessoas que morreram na luta por direitos, como Chico Mendes e Irmã Dorothy. Com cantos e preces, eles ofereceram uma experiência mística e espiritual, celebrando a cultura do cuidado com os dons da natureza.

Painel

O primeiro painel do evento teve como tema “Desafios da Amazônia atual”. Como debatedores, estiveram presentes André de Paiva Toledo, da Dom Helder; Adelson Santos, Pontifícia Universidade Gregoriana, de Roma, e integrante do Sínodo para a Amazônia; Marcivâna Seterè Mawè, da Coordenação dos Povos Indígenas de Manaus e Entorno (Copime) e auditora do sínodo. A mediação ficou a cargo de David Romero, da Paam.

Marcivana tratou dos ataques que os povos amazônicos vêm recebendo e da luta pelos seus territórios. Segundo ela, “a Amazônia sempre foi pensada na perspectiva da exploração dos nossos elementos (recursos naturais) e nunca a partir das nossas comunidades”. Ela enfatizou a importância de se ouvir os amazônidas.

“Vivemos tempos sombrios não só na Amazônia, mas em todo Brasil. Tempos de retirada de direitos, não só dos povos originários, mas do meio ambiente”, alertou, lembrando a importância do território para a cultura indígena. “A relação dos povos indígenas com a terra é sagrada. O indígena não separa a terra de si. Não temos como separar os elementos sagrados da nossa vida. Quando defendemos a terra estamos defendendo o nosso corpo. Não estamos pensando nos nossos povos apenas, mas em todas as gerações”, completou.

André de Paiva fez uma análise que buscava responder a questão dos desafios apresentados pela Amazônia ao Direito Internacional. Nesse sentido, ele enfatizou que o processo de esquecimento da subjetividade dos povos amazônicos é alarmante na perspectiva do Direito. Observando a conjuntura atual, o professor destacou a postura do governo brasileiro na violação dos direitos de demarcação de terras e de sua aproximação com as posturas adotadas no período da Ditadura Militar. Como consequência, ele adverte sobre a possibilidade de um novo genocídio dos povos amazônicos.

Adelson Santos tratou do sínodo como espaço de escuta do papa sobre os desafios da Amazônia. Segundo o padre e professor, a reunião dos bispos estava em alerta pela possibilidade de catástrofes futuras em decorrência da destruição do bioma amazônico. O apelo decorrente das discussões seria a conversão ecológica.

“Conversão! É a palavra que descreve o sínodo, a partir de uma mudança de mentalidade. Devemos nos converter para salvarmos o mundo de mentalidades que não defendem os povos amazônicos e desejam o seu extermínio. O documento do sínodo chama a uma conversão integral, que inclui a salvação do planeta Terra”, frisou Adelson.

Assista a entrevista de Thiago Ventura com pe. Adelson Santos, SJ:

 

Redação DomTotal