Greta Thunberg e os milhares de jovens das Fridays for Future estão aplicando muitas páginas da Laudato si’, a encíclica ecológica do Papa Francisco. Palavra do padre Paolo Benanti, franciscano, professor da Faculdade de Teologia – departamento de teologia moral – na Pontifícia Universidade Gregoriana, universidade dirigida pelos Jesuítas. Para o teólogo, esses jovens “são uma perspectiva diferente que integra, promove e conduz a um cuidado real pela casa comum”. A Criação, denominada com o termo cristão e em letra maiúscula.
A entrevista é de Iacopo Scaramuzzi, publicada por Vatican Insider, 09-04-2019. A tradução é de Luisa Rabolini.
Professor, como descreve a iniciativa de Greta e das Fridays for Future?
Essa mobilização global responde a uma dinâmica semelhante àquela com a qual a Igreja enfrenta as questões sociais.
Em que sentido?
É sustentada por três verbos: ver, julgar, agir. Greta e os ativistas ‘viram’ a realidade, percebendo suas fortes contradições; ‘julgaram’, isto é, reconheceram a ausência de um futuro que esse nosso estilo de vida produz; decidiram ‘fazer’ algo para produzir uma mudança.
Qual é a sua mensagem mais importante?
Eles nos lembram que a ‘casa comum’, como o Papa Francisco define a questão ambiental na Laudato si’, é algo que cada geração herda de seus antecessores e tem a tarefa de transmitir às gerações futuras. Nossos filhos nos lembram que o amanhã deve ser olhado com esperança e que a esperança não é mera passividade, mas uma construção efetiva do amanhã”.
Quanto há da Laudato si’ no pensamento e nas ações desse movimento?
Um tema que atravessa a Encíclica é um apelo a um paradigma chamado de ecologia integral, para o qual não basta integrar a leitura dos diferentes fenômenos. É exemplar, principalmente, a crítica que é dirigida à lógica mundana que leva a perder de vista a complexidade dos vínculos e das interações: ‘a tecnologia que, ligada às finanças, afirma ser a única solução para os problemas, não é de fato capaz de ver o mistério das múltiplas relações que existem entre as coisas e, por isso, às vezes resolve um problema criando outros”. A ecologia integral nos permite recuperar o apelo à responsabilidade humana, evidente quando se considera o lugar que o ser humano ocupa no plano das relações ecossistêmicas. Greta e o movimento que ela inspira parecem estar em profunda sintonia com tudo isso.
Após a greve verde de 15 de março, quais são os próximos passos a serem feitos?
Aplicando intimamente a ecologia integral, que não diz respeito apenas ao modo de compreensão racional da realidade, mas é constituída pelos desejos e atitudes subjacentes do nosso coração e tem uma dimensão claramente espiritual. Só se compreendermos essa dimensão, poderemos entender por que ela também deva se orientar para caminhos de conversão interior que compreendam sérios exames de consciência ‘para recuperar a serena harmonia com a criação, para refletir sobre o nosso estilo de vida e nossos ideais’.
Quais consequências concretas podem surgir? Não há uma desproporção entre a imensidão do problema ecológico global e as potencialidades dos indivíduos?
É preciso entender plenamente o alcance até mesmo das pequenas ações cotidianas de atenção ao meio ambiente que o Papa Francisco nos propõe: ‘evitar o uso de plástico ou papel, reduzir o consumo de água, separar os resíduos, cozinhar apenas o necessário que será consumido, tratar com cuidado os outros seres vivos, utilizar o transporte público ou compartilhar o mesmo veículo entre várias pessoas, plantar árvores, apagar luzes desnecessárias’. Quando partem de motivações profundas, esses gestos não são deveres ascéticos de uma ideologia verde assumida como critério de vida, mas atos de amor que traduzem uma espiritualidade vivida em um critério operacional ético de compromisso, em todos os níveis da vida pessoal.
O que a política é chamada a fazer?
Na Laudato si’ lemos que ‘procurar apenas um remédio técnico para cada problema ambiental, significa isolar as coisas que, na realidade, estão conectadas e esconder os verdadeiros e mais profundos problemas do sistema mundial’. E assim se alimenta uma ‘ecologia superficial’ que se deixa enredar ‘dentro da lógica das finanças e da tecnocracia’. Em vez disso, uma estratégia de mudança real ‘exige repensar a totalidade dos processos’, porque ‘não basta inserir considerações ecológicas superficiais’, enquanto não for posta em discussão ‘a lógica subjacente à cultura atual’.