STF inicia julgamento de 5 ações sobre o novo Código Florestal (Lei 12.651/2012)

O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) iniciou nesta quinta-feira (14) o julgamento de cinco ações que tratam do novo Código Florestal (Lei 12.651/2012), todas de relatoria do ministro Luiz Fux.

A reportagem é publicada por Supremo Tribunal Federal — STF, 14-09-2017.

As Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) 4901, 4902 e 4903, ajuizadas pela Procuradoria-Geral da República, e a ADI 4937, de autoria do Partido Socialismo e Liberdade (PSOL), pedem a inconstitucionalidade de diversos dispositivos do novo Código Florestal. Já a Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) 42, proposta pelo Partido Progressista (PP) defende a constitucionalidade da lei.

PSOL

Na primeira parte da sessão, as partes apresentaram suas alegações aos ministros. Em nome do PSOL, o advogado André Maimoni afirmou que o partido, embora seja a favor do desenvolvimento e dos negócios agropecuários, tem uma visão diferente quanto ao uso da terra da que foi expressa pela lei que, em seu entendimento, viola os princípios da responsabilidade e da solidariedade entre as gerações. Segundo ele, a norma flexibiliza e fragiliza o sistema ambiental. Ele apontou como inconstitucional, entre outros pontos, a anistia concedida aos produtores rurais em relação a danos ocorridos antes de 2008, sustentando que ainda que seja possível abrir mão de penas administrativas ou criminais, o mesmo não ocorre com a obrigação de reparar o meio ambiente. “Na visão do partido, a Constituição não dá guarida para irresponsabilidade em relação ao meio ambiente”, afirmou.

PP

O representante do PP, Rudy Maia Ferraz, afirmou que o novo Código Florestal faz a composição de interesses antagônicos e que revogar a lei depois de cinco anos de vigência representaria retrocesso. Em seu entendimento, a norma faz a composição entre pontos antagônicos, mas legítimos. Disse, ainda, que o partido foi motivado a ajuizar a ADC 42 porque, em razão de diversas decisões judiciais com resultados discrepantes, os produtores rurais estavam tendo dificuldades em saber quais pontos da lei estavam em vigor. Também em nome do PP, o advogado Vicente Gomes, argumentou que o novo código representa avanços na legislação do ponto de vista ambiental, dará previsibilidade e segurança jurídica e irá permitir maior controle sobre a preservação dos remanescentes de mata atlântica e do cerrado.

PGR

O vice-procurador-geral da República, Nicolau Dino, afirmou que, no entendimento da PGR, o novo código é falho na tentativa de conciliar preservação ambiental e desenvolvimento sustentável, dois preceitos constitucionais. Segundo ele, houve uma flexibilização nas regras de uso quanto às Áreas de Preservação Permanente (APP) e de Reserva Legal Florestal, reduzindo, de forma indevida nos níveis de proteção. Ele lembrou que a Constituição promove o que classificou de “direito de propriedade ambientalmente qualificado”, condicionando seu exercício com o dever de proteção ambiental e a manutenção de sua função social.

Apontou que, do ponto de vista da sustentabilidade ambiental e da função ecológica da reserva legal, é inconstitucional permitir sua recomposição com o plantio de espécies exóticas. Apontou os dispositivos que consolidam áreas desmatadas antes das alterações dos percentuais de reserva legal exigidos, concedem anistia de multas e isentam de reparação os responsáveis por desmatamento ilegal ocorrido antes de 22 de julho de 2008, violam a regra constitucional de proteção ambiental e reparação de danos.

AGU

A ministra da Advocacia-Geral da União, Grace Maria Fernandes, defendeu a constitucionalidade das regras do novo Código Florestal. Segundo ela, a lei inaugura uma nova perspectiva referente à gestão ambiental, fazendo o equilíbrio entre preservação ambiental e desenvolvimento nacional, sob o ponto de vista do desenvolvimento sustentável. A ministra afirmou que a gestão integrada de APPs e reservas legais é estratégia para evitar o fracionamento dos habitats e permitir sua melhor conservação. A ministra afirmou que a recomposição ambiental é obrigatória, mesmo para desmatamentos ilegais ocorridos antes de julho de 2008, mas o tratamento dado aos agricultores que tenham promovido danos ambientais é diferenciado, estimulando a recomposição das áreas.

De acordo com ela, as novas regras estimulam o infrator a se tornar um agente de recuperação de áreas degradadas pois, enquanto o proprietário rural cumprir termo de compromisso de reparação, as infrações nas quais tiver sido autuado ficam suspensas. Ela explica que não há anistia, mas sim a conversão da multa pecuniária em prestação de serviços ambientais e apenas no caso de a reparação pactuada ter sido integralmente cumprida. Afirmou, ainda, que a norma não é falha em relação à proteção ambiental no tocante à redução da reserva legal que, segundo a ministra, ocorre apenas na Amazônia Legal e se o município já tiver pelo menos 50% de sua área protegida, seja por unidade de conservação ou por reserva indígena.

Na sequência do julgamento, pronunciaram-se os representantes das entidades admitidas nos processos como amici curiae (amigos da Corte).

Representantes de “amigos da Corte” apresentam argumentos em julgamento sobre Código Florestal

Em continuidade ao julgamento das ações que tratam do Código Florestal (Lei 12.651/2012), representantes dos amici curiae (amigos da Corte) falaram da tribuna do Supremo Tribunal Federal (STF) na sessão plenária realizada na tarde desta quinta-feira (14). A Corte deu início ao julgamento de quatro ADIs que pedem a inconstitucionalidade do novo Código Florestal por variadas alegações, entre elas a redução de reserva legal, além de uma Ação Declaratória de Constitucionalidade que defende a constitucionalidade da lei.

Apoio às ações

Ao falar sobre os impactos do Código Florestal e apoiar as ações ajuizadas, o advogado Maurício Guetta representou o Instituto Socioambiental – Isa, Rede de Organizações Não-governamentais da Mata Atlântica (RMA), Mater Natura – Instituto de Estudos Ambientais e a Associação Mineira de Defesa do Ambiente (AMDA). Segundo ele, há décadas a ciência tem alertado que a vegetação nativa é sinônimo de água e, sem ela, além da ameaça à sobrevivência da população, estarão em risco as atividades agrícolas, pecuárias e de silvicultura – que consomem cerca de 70% dos recursos hídricos utilizados no país – e as industriais – que respondem por cerca de 20% do consumo –, além da produção de energia.

Em nome das entidades Terra de Direitos, Associação Brasileira de Reforma Agrária (ABRA), Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional (FASE) e Núcleo Amigos da Terra Brasil (NAT), o advogado Carlos Frederico Marés de Souza Filho defendeu a inconstitucionalidade dos dispositivos questionados, portanto a procedência das ações. “Represento os pequenos agricultores que querem a natureza boa, saudável, para que seus filhos e netos continuem sendo trabalhadores rurais”, disse. Segundo ele, a Constituição Federal (artigo 225) visa proteger a biodiversidade, portanto é inconstitucional diminuir a reserva legal e a área de proteção ambiental para não agredir a biodiversidade.

Constitucionalidade dos dispositivos

Outras entidades ocuparam a tribuna para defender a improcedência das ações. A Associação Brasileira do Agronegócio (ABAG), representada pelo advogado Ewerton Azevedo Mineiro, afirmou que todos são favoráveis a um meio ambiente equilibrado e também a um país desenvolvido. Assim, avaliou que o Código Florestal é fruto dessa conciliação de interesses, ou seja, de uma ponderação de princípios. Para a geração futura é necessário se ter um meio ambiente para vislumbrar, bem como um país forte e que produza. Portanto, com base em tal conciliação, considerou que ao Código contestado é a melhor norma possível.

Pela Confederação Nacional do Sistema Financeiro (CONSIF), o advogado Luciano Giongo Bresciani destacou o artigo 78, inciso “a”, do Código Florestal, – cuja constitucionalidade é alvo de uma das ações – o qual impõe às instituições financeiras que, após cinco anos de vigência do Código, exijam dos agricultores rurais a inscrição no Cadastro Ambiental Rural (CAR) como condição necessária para obtenção de crédito agrícola. De acordo com o advogado, esse artigo determina uma norma auxiliar de fiscalização dos proprietários rurais que, obrigatoriamente, deveriam ter o seu imóvel rural inscrito no CAR antes de pretender qualquer tipo de crédito, isto é, o dispositivo incentiva a regularização das áreas e a obtenção, pelo poder público, de informações mais precisas sobre as áreas rurais.

Em nome da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), o advogado Rodrigo Justus de Brito, ressaltou os impactos socioeconômicos negativos para o país, caso os pedidos das ações sejam julgados procedentes. Também salientou que o Código Florestal brasileiro, em termos de restrição de uso à propriedade rural e proteção à vegetação nativa, é a lei mais rigorosa do mundo. Ele observou que toda a produção agrícola do Brasil – considerando floresta, cana de açúcar e toda a agricultura – ocupa 9% da área do país e acrescentou que 20% das áreas de pecuária poderão ser convertidas para áreas de agricultura.

O advogado Leonardo Papp representou a Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB) que, apenas na área rural, reúne 1 milhão de famílias, das quais 84% são de pequenos produtores rurais. “Mais do que o imperativo ético, a conservação da qualidade do meio ambiente é um fator indissociável para a qualidade de vida dos seus associados”, salientou, ao defender a integral constitucionalidade dos dispositivos questionados. Para Leonardo Papp, esse não é um retrocesso político-democrático, ao contrário da lei anterior que foi produzida no regime ditatorial. Ele avaliou que o artigo 61-A – que trata das áreas rurais consolidadas – é o resultado de um processo de deliberação ampla, público e plural feito do Congresso Nacional, “assim não se trata de retrocesso social”.

Representando a Associação Brasileira dos Produtores Independentes de Energia Elétrica (APINE), o advogado Marçal Justen Filho destacou que transformar o artigo 225, da Constituição Federal, em realidade implica uma atividade de construção que se faz por meio do Estado e da sociedade permeada por uma decisão do Parlamento, “onde incumbe discutir como é possível chegar mais próximo aos ideais absolutos de realização de valores contra os quais não se transige”. Segundo ele, não cabe ao Supremo se substituir ao povo na escolha do modo de realização de determinadas questões que são extremamente complexas em termos de compatibilização de direitos e interesses.

A advogada da Associação Brasileira de Companhias de Energia Elétrica (ABCE), Paula Suzanna Amaral Mello, observou que a presente discussão gira acerca da vedação ao retrocesso. De acordo com ela, a análise da matéria, por envolver restrição a direitos fundamentais, deve ser pautada na proporcionalidade e na adequação. A advogada destacou que a nova lei florestal não suprime garantias, não restringe direitos nem a proteção ao meio ambiente. “Essa norma é fruto do entendimento do legislador e da análise de aspectos históricos, culturais e econômicos e da necessidade, à luz de critérios científicos e ambientais, de se revisar a antiga lei”, observou.

Fonte: www.ihu.unisinos.br